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Minhas memórias em TerraPreta

  • Jessica Marzo
  • 20 de jun. de 2022
  • 2 min de leitura

“As gotas de chuva começaram a cair e eram as maiores que Ana já vira, doíam na pele, feito tapas. Toda a natureza ali era excessiva” (Terrapreta – @mritacarelli) .


Fui levada por Ana pra Amazônia. Ali, perdida na mata, entendi que meus saberes urbanos de nada valem. Aprendi a importância dos rituais e da mitologia.


Eu e Ana nascemos em São Paulo no mesmo ano, também fui uma das últimas a ficar menstruada, ganhei um absorvente e ouvi os adultos dizerem, entre eles, que eu estava mocinha. Pra mim nada mudou, era a mesma.


No Xingu, conheci Kassuri, reclusa, por conta da primeira menstruação. As meninas passam por um ritual de isolamento que pode levar até um ano. Deixam a franja crescer e cobrir o olho para que não façam contato visual, não fazem exercícios, assim pernas e bundas engrossam. Passam por restrições alimentares, aprendem a fazer todo tipo de artesanato e recebem os ensinamentos das mulheres da família para se tornarem mãe e esposa.


Ana é menina de cidade grande, ao chegar no Xingu, pega emprestado o ritual dos povos indígenas para atravessar a puberdade, e vai se tornando “mocinha” junto com Kassuri, que na festa do Kuarup, terá sua franja cortada e estará pronta para casar. No Kuarup as almas dos mortos se libertam, e os vivos choram, e Ana aproveita a festa para chorar o luto e derramar as lagrimas que ficaram presas em São Paulo.


De dentro da sala do meu apartamento, sentada no meu sofá em frente a janela de vidro com vistas pra Avenida Sumaré e muitos arranhas céus, pude sentir o cheiro de palha das casas na aldeia, o som dos pássaros em algazarra, ramas espinhentas agarrarem nos meus calcanhares, o arrepio do corpo no banho de rio logo cedo e a fumaça do café quente e doce de Padjá.


Terrapreta é leitura obrigatória, além de me levar ao Xingu, me apresentar as histórias da floresta e o cotidiano indígena, pescou a menina de prédio, escritora de diários, nula em palavras quando precisa dizer algo diante de alguém.


Ana me disse que somos uma raça de acumuladores compulsivos, não só de coisas, mas também de sentimentos, lembranças, até a intoxicação. Fechei o livro e fui me procurar em diários e fotos de 20 anos atras.




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jemarzo@hotmail.com

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