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Escute as Feras

  • Jessica Marzo
  • 19 de abr. de 2023
  • 2 min de leitura

Outono é o nome do capítulo que abre o livro. Nastassja agasalhada dos pés à cabeça numa cabana no meio da neve na Sibéria. Eu, no outono do Brasil, viro as páginas sentada na cama de braços e pernas de fora, debaixo do ventilador.


Nastassja tem mais ou menos a minha idade, somos formadas em Antropologia e anotamos tudo em vários caderninhos. Ela também leva a sério seus sonhos. De noite vê com mais clareza, porque vê além daquilo que é imediatamente dado aos sentidos da vida diurna. São várias as semelhanças, tantas quantas as diferenças entre nós. Um frio danado, que nunca senti no corpo. Pessoas com nomes difíceis de pronunciar. Um cenário bruto, no sentido de intocado, que está como existe na natureza.


“No fundo dos bosques congelados, não se “encontram” respostas: aprende-se antes de tudo a suspender o próprio raciocínio e se deixar levar pelo ritmo, aquele da vida que se organiza para que possamos nos manter vivo numa Floresta durante o inverno. Tento achar em mim um silêncio tão profundo quanto o das grandes árvores que lá fora se mantém imóveis e verticais no frio.” ( Escute as feras – Nastassja Martin)


Depois de um encontro-ataque-beijo com um urso Nastassja perde suas formas. É no silêncio da floresta, distante de suas raízes, que ela procura compreender as brechas abertas em seu rosto. “Perdi meu lugar, procuro um entremeio. Um lugar para me reconstituir”. Junto com essa mulher, talvez meia humana meia fera, senti o ar gelado e o aroma do chá quente. Busquei por silêncios na floresta fria e nas paredes do útero de minha mãe. Me lembrei das vezes em que me desmarginei, tive que procurar e reconstruir uma nova forma para mim. O livro é denso, sacudi ele pra baixo pra ver se caia neve e então liberava a travessia para que eu pudesse também encontrar e escutar as feras.










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