Desromantizando o casamento
- Jessica Marzo
- 26 de out. de 2022
- 2 min de leitura
Atualizado: 22 de mar. de 2023
Estou há poucos dias de completar 10 anos de casada e revendo a série, “ Cenas de um casamento”. É um tapa na cara das relações amorosas mais longas. São 5h de DR de um casal em separação.
Os diálogos são profundos e tristes. As cenas são fortes e sinceras. Dá pra ter raiva dela; depois dele. Torcer por ela sozinha, por ele sozinho e pelos dois juntos. Causa incomodo, angústia. Dispara gatilhos. A primeira vez que assisti joguei pra debaixo do tapete, não quis pensar, porque pensar sobre a série seria pensar sobre o meu casamento. Essa semana ouvi o podcast “Meu Inconsciente Coletivo” em que um psicanalista e uma escritora levam os personagens para o divã.
Entendi que meu incomodo está na romantização do casamento. O encontro com a pessoa pode ser romântico, a festa de casamento quase sempre é beeeem romântica. Mas o dia a dia não é romântico. Tem conta pra pagar, cozinha pra varrer, e as vezes filho pra criar. E o que é o casamento senão o compartilhamento de uma rotina exaustiva e medíocre? Não se vive de festas, viagens, sexo e picos de adrenalina todos os dias. O viver rotineiro, aqueles 80% do dia, não é instagramável. É acordar com pressa, dar a descarga, apertar o botão do elevador, comer arroz com feijão, passar o dia com a cabeça fritando de tudo o que tem que ser feito no dia.
Muitos casamentos terminam porque acaba a paixão, o desejo. O psicanalista do podcast disse: “O desejo está na falta”. Claro, por isso não é possível que o desejo eterno e infinito no outro seja o elemento primordial do casamento. Ainda segundo o mesmo psicanalista, “fundamentalmente o amor e o desejo são coisas separadas, não andam juntas.” Eita, então como faz pra manter viva uma relação?
Essa é a pergunta do milhão! Enquanto se romantizar o casamento, as expectativas serão para sempre frustradas. E aí, casais que se amam, se separam, porque não estão mais apaixonados. E separados, voltam a se apaixonar, porque o desejo está na falta. Nós queremos, o que não temos, essa inclusive, é a lógica do mercado. Você deseja um produto que não tem, aí você compra. Aí você deseja outro produto que não tem, aí você compra... é o amor líquido, de Bauman, aquele que não tem forma, que escorre entre os dedos, fugaz, superficial, etéreo sem compromisso.
Tem casamentos que são tóxicos, machucam, e desses devemos nos libertar. Tem casamentos sólidos, que dão força pra ambos, tem troca, afeto e respeito. Mas depois de alguns anos é trivial, porque é assim a maior parte da nossa vida. É o pão com ovo, o chinelo havaianas, a novela das 20h. Não é um feed cheinho de novidades, com drink exótico, cenários paradisíacos, vestidos esvoaçantes e desejos incessantes. No geral, na maior parte do tempo é ordinário e corriqueiro.
Só não esqueçamos, neste mundo acelerado, que o novo fica velho, rapidinho, rapidinho.

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