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A velhice e a necessidade do esquecimento

  • Jessica Marzo
  • 12 de dez. de 2023
  • 2 min de leitura

Ta aqui meu favorito do ano. Eu amei a desordem que Aurora, uma senhora com confusão mental, fez em minha cabeça. Peguei na mão de Rosa, a cuidadora do abrigo de idosos e fui tentando juntar as pecinhas da vida de Aurora. Um caderno de memórias. Achei tão lindo.


Aurora conta como foi difícil sobreviver a morte da filha, de dois anos. No outro dia, ela conta como se arrepende de nunca ter tido filhos. No outro dia, ela conta como foi difícil ver a filha adolescente morrer num acidente de carro. E então, no outro dia ela acorda, e culpa Antônio, seu companheiro por nunca ter tido filhos.


“ (...) qual a importância de assinalar meu caderno de memórias, se as memórias são exatamente lembranças(...)”


Tem muita cena triste no livro. Aurora lembra de diversas mortes da filha. E eu torci pra que fosse tudo invenção porque dói demais pensar num filho morto. Mas como a escrita é divertida a gente nem pensa em abandonar. É muito gostoso de ler.


Tem cenas bonitas entre duas mulheres muito amigas. Fiquei com saudades de quando dividia meu cotidiano com minhas amigas. Também tem reflexões profundas sobre a maternidade, a vida com filhos, sem filhos, sobre a relação com a mãe.


Eu tenho pensado muito na velhice, talvez porque esteja vendo minhas avós ficarem bem velhinhas e sozinhas. Deve passar um filme na cabeça. Esses dias ouvi Gilberto Gil dizer que aos 81 anos vem a necessidade do esquecimento, não só do passado, mas de tudo.


E tem algo muito interessante no livro, que é a reflexão sobre a culpa. Na velhice as culpas ficam jovens, e não dormem, ficam ainda mais vigilantes no sono, trazem insistentes sonhos sem criatividade que são na verdade imitações da própria culpa, releituras da vida que já foi. A culpa de ter um filho e deixar ele morrer. A culpa de não ter um filho. A culpa de se ter momentos felizes vivendo num país como o nosso.


“ Há essa questão deste pais especialista em culpas (...). Há sempre um momento em que este pais borbulha desagradável no estomago e indispostos olhamos a janela cúmplices de tudo isso. Ha dois tipos de pessoas, as que lutam e as que fogem. Sou das que fogem brutalmelmente"



O livro é profundo, trágico e cômico. Vale a leitura




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