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Feliz dia das mães

  • Jessica Marzo
  • 27 de mai. de 2021
  • 3 min de leitura

Certo dia, logo cedinho, pronta para minha caminhada matinal, que dura em média uma hora, a minha filha mais velha grudou em minha perna e pediu que eu não fosse. Como era o dia do aniversário da irmã mais nova, ela insistiu que eu não poderia sair. A mais nova, a pequena aniversariante, já tinha se despedido com muitos beijos e abraços, porém, a mais velha não se conformava com a minha saída justo naquele dia.

- não é justo, você ama mais você do que a gente – minha filha gritou num choro profundo.


Aquela frase acessou minhas memorias afetivas e transbordou. As palavras saídas da boca de minha filha, puxaram as palavras guardadas de dentro de mim, atravessaram meu corpo e caíram estiradas no chão da sala. “VOCE AMA MAIS VOCE DO QUE SEUS FILHOS”. A frase gritou com precisão e foi lida pelos olhos da minha infância e minha adolescência. Eu também um dia senti exatamente isso, eu também um dia não me conformei com os pedidos negados de minha mãe.


Nós, filhos, acreditamos (e até exigimos) que as mães estão no mundo para nos servir. No amor de mãe só cabem os filhos. Na fala de minha filha me lembrei de quantas vezes senti raiva e tristeza quando percebia que minha mãe se interessava mais por outras coisas do que por mim.


Numa sociedade que sufoca com os cuidados da casa e dos filhos a energia intelectual das mulheres, acomoda-se como natural abafar, encobrir, negligenciar desejos e potenciais criativos das mães. Abrir o espaço de autocuidado, de priorização, é como nadar contra a maré; é atravessar um caminho de área movediça que te puxa para baixo; é combater estruturas históricas e muito estabelecidas. E isso cansa, ainda mais para quem já está tão sugada e exaurida pelo cotidiano.


Entender a importância subjetiva e política de não se abandonar chega a ser um ato revolucionário. Daria a vida pelas minhas filhas se necessário? Muito provavelmente. Mas se não for necessário, ocuparei meu espaço, minha existência. E não sou supermãe, não quero e não posso dar conta de tudo sozinha, porque “o tudo” é grande, é enorme, é muito maior do que os olhos patriarcais conseguem alcançar. Nós mães precisamos de muitas mãos para abrir os espaços (dentro e fora) que nos permitam experimentar a vida e os encontros profundos e intensos conosco, com o outro e com o mundo.


Devagarinho eu tenho buscado estes espaços ainda pequenos para mim, mas grandes para minha filha. Levei meses para conquistar o meu espaço de caminhar sozinha; e dele não vou abrir mão. Por isso, respondi à minha filha:

- é preciso que eu me respeite para que você me respeite, é preciso que eu me ame para que você me ame, é preciso que eu caminhe sozinha, para que você caminhe sozinha. Daqui uma hora estou de volta; fui. E fui.


Neste segundo ano de pandemia, eu desejo espaço para as mães poderem ir aonde o corpo e a mente as levarem. Desejo espaço para criar, espaço para dançar, espaço para trancar a porta do banheiro, espaço para ler, espaço para caminhar. Espaço para estarem sozinhas. Espaço para ocupar o mundo, espaço para ocupar seu o corpo, as entranhas. Espaço para ser o que quiserem ser. Um feliz dia para as mulheres que também são mães.




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